A A.C.I.M.A. – dando
continuidade ao projeto de mapeamento dos artistas e escritores
brasileiros residentes no exterior - “Vitrine do Artista Brasileiro
no Exterior”, inciado em setembro de 2011, tem o prazer de
entrevistar o escritor ANTONIO
SALVADOR, residente na Alemanha.
O projeto
“Vitrine do Artista Brasileiro no Exterior” da A.C.I.MA. abraça
a arte e a cultura dos povos migrantes em todas as suas formas e
manifestações – sejam elas, musicais, literárias, teatrais,
artes plásticas, cinema, dança, fotografia, folclore, enfim, todas
as expressões artísticas brasileiras.
A.C.I.M.A. entrevista o escritor ANTONIO SALVADOR
“Vitrine do Artista Brasileiro no Exterior”
“Vitrine do Artista Brasileiro no Exterior”
A.C.I.M.A.
– Bem vindo ANTONIO SALVADOR, é uma honra tê-lo conosco!
Primeiramente, gostaríamos de saber um pouco sobre você: de onde
vem, qual sua terra natal? Onde vive atualmente?
A.
S. – Eu considero que tenho duas terras natais. A primeira
delas é a cidade de Natal, Rio Grande do Norte, onde nasci de fato,
às 16:00 hs de uma sexta-feira, estragando o final de semana da
família, pois resolvi vir ao mundo prematuramente. A segunda é a
cidade de São Paulo, onde nasci como indivíduo ou, melhor dizendo,
onde nasceu minha cosmovisão, onde fui morar três ou quatro anos
depois do meu nascimento natural. Depois disso, renasci algumas
outras vezes, em outros lugares, como, por exemplo, aqui na Alemanha,
em Berlim, onde vivo atualmente.
A.C.I.M.A.
– Como foi sua adaptação na Alemanha e quais as maiores
dificuldades que encontrou no exterior? Maiores alegrias?
A.
S. – A
adaptação na Alemanha foi rápida, deu-se antes mesmo de eu me
transferir para cá. Eu já conhecia bem o país, a língua, já
havia estado aqui algumas vezes. A cultura alemã é muito
interessante, o processo civilizatório foi dramático,
os alemães
sentem-se estigmatizados e isto está refletido na maneira como as
pessoas se relacionam umas com as outras. Há uma melancolia aqui, um
lirismo, que o Brasil desconhece. Eu me identifico bastante com o
modo de ser do povo alemão, ao mesmo tempo em que compreendo o quão
profundas são as diferenças culturais. Todas as minhas alegrias
decorrem desse embate interior. As dificuldades, por outro lado, não
guardam necessária relação com o fato de viver no exterior.
Honestamente, há mais dificuldades em viver numa cidade como São
Paulo, onde o caos desaba sobre nossas cabeças minuto a minuto, ou
numa cidade como Natal, um feudo político esquecido numa esquina do
Brasil. Viver na Europa, e particularmente na Alemanha, o país mais
desenvolvido do continente europeu, é uma experiência que me tem
permitido conhecer ainda melhor o Brasil, um tipo de conhecimento que
só é possível a partir do distanciamento geográfico.
A.C.I.M.A.
– Como e quando se dá o seu primeiro contato com a escrita? Sobre
qual tema você escreve? De onde vem as inspirações para suas obras
literárias? Poderia nos contar um pouco sobre seu processo criativo?
A.
S. – Meu
primeiro contato com a escrita literária deu-se aos cinco anos,
quando escrevi meu primeiro livro. Antes mesmo de ter lido um livro,
escrevi um. Dos cinco aos vinte e cinco anos, devo ter escrito entre
dez e quinze livros, até começar a pesquisa para o meu romance de
estréia: “A Condessa de Picaçurova”. Digo, “estréia” para
o público. Da obra pregressa pouco restou. Considero tudo
o
que escrevi
antes
de “A Condessa de
Picaçurova” mero exercício de composição da minha voz
narrativa. Sobre temas, eu não costumo pensar neles antes de
escrever. O enredo também não é o ponto de partida. Temas e
enredos não me comovem. A palavra como matéria-prima, a linguagem
como argamassa, o texto como escultura, é isso o que mais me
inspira. Mas estou sempre atento. Acho perigoso o fetiche em torno da
linguagem. A ideia da literatura calcada unicamente na arquitetura da
linguagem soa positivista. É uma casca estéril. Minha obsessão é
pelo personagem, ou mais precisamente pela construção do
personagem. Uma vez construído o personagem, ele próprio expõe
seus temas, sua doença, suas obsessões, ele é o único descobridor
e condutor do enredo. Todo o meu processo criativo é formado pelos
andaimes em torno do personagem.
A.C.I.M.A.
– Poderia nos falar um pouco sobre suas obras, seu percurso,
e particularmente sobre as importantes premiações literárias das
quais participou?
A.
S. – Participei
como colaborador de institutos internacionais voltados para a
pesquisa sobre Diversidade Cultural, como o DiverCult, desenvolvido
na Espanha, e a RAIA – Rede Audiovisual Ibero-Americana. No mesmo
período, colaborei com a pesquisa e arquitetura do documentário
Ctrl-V
– VideoControl,
do diretor Leonardo Brant, lançado em 2011, sobre os efeitos da
indústria cinematográfica no imaginário das sociedades
contemporâneas. O
meu primeiro romance é “A Condessa de Picaçurova”, publicado em
meados de 2012 e, no mesmo ano, indicado a um dos mais respeitados
prêmios literários do Brasil: o Prêmio Machado de Assis da
Biblioteca Nacional. Creio que fui o único autor realmente
“estreante”, ou seja, sem qualquer obra pregressa publicada, a
concorrer com grandes nomes da literatura contemporânea, como Nélida
Pinon, Luiz Vilela, João Gilberto Noll, Luiz Ruffato, enfim, autores
que admiro profundamente. O romance já havia vencido
o
Prêmio Nascente da Universidade de São Paulo, na categoria melhor
romance, em 2009. Em
2013, enquanto eu participava da Frankfurter
Buchmesse,
em homenagem ao Brasil, recebi
a indicação da Secretaria de Cultura do Estado de São Paulo, na
categoria “abaixo de 40 anos”, para o Prêmio São Paulo de
Literatura. O processo todo relacionado às premiações literárias
tem sido extremamente positivo, em termos mercadológicos e de
interesse pelo romance. O livro está em plena adaptação para o
teatro, além de outras novidades sobre as quais prefiro não falar
ainda.
A.C.I.M.A.
– Qual foi a pessoa que primeiramente acreditou em seu
talento? E qual outra linguagem da Arte tem o seu interesse?
A.
S. – “Acreditar
no talento” é uma expressão maravilhosa! Significa que existe a
crença, sem que se possa confirmar o talento! De todo modo, a
primeira pessoa que acreditou que eu tinha algo a dizer foi o meu
pai. O diálogo entre nós sempre se deu por meio da literatura. Ele
lia tudo o que eu escrevia e me incentivava bastante, comprava
coleções de clássicos, me entregava. Eu sempre li muito desde
pequeno. Kafka, Dickens, Balzac, Machado, estavam sempre à mão, nas
estantes de casa. Aos onze, doze anos, ele ficou impressionado com um
romance infanto-juvenil que escrevi e me matriculou numa escola de
belas artes. A partir de então, tive contato com diversas outras
formas de expressão artística, aperfeiçoei o meu traço e passei a
me dedicar intensamente ao desenho e à xilogravura. Depois disso,
fiz praticamente tudo: atuei como ator, dramaturgo, diretor, produzi
e gravei um disco, pintei alguns quadros, esculpi, enfim, quase tudo.
São todas formas de Arte que aprecio e me sensibilizam muito.
A.C.I.M.A.
– O
que você acha que seria prioritário fazer para criar oportunidades
para valorizar e divulgar o trabalho dos escritores e artistas
brasileiros no Brasil e no exterior?
A.
S. – Nada pode ser feito para “valorizar” o trabalho dos
escritores, nem no Brasil nem fora. A atribuição de valor é um
processo histórico. Apenas o tempo, e realmente só o tempo, dirá
quais obras serão alçadas ao patamar das obras “valiosas”. Por
melhor que seja a resenha, o prêmio, o elogio na primeira página do
jornal, isso tudo não passa de maquiagem, uma maquiagem efêmera que
serve apenas para realçar e falsear qualidades. Este realce e
falseamento encontram sentido no plano das sociedades de consumo. São
artifícios empregados para fins mercadológicos, em que a literatura
também é produto, mas em termos históricos não possuem qualquer
relevância. A divulgação das obras e a criação de oportunidades
também depende de fatores mercadológicos e essa parte é
relativamente fácil, pois independe de mérito literário. Basta que
o autor saiba se situar no mercado e esteja disposto a permanecer
nele. O mercado só quer quem o queira. Antes de lamentarmos esta
realidade, basta que lembremos do tempo e de sua mão inclemente.
Toda euforia será silenciada.
A.C.I.M.A.
– Na sua opinião, qual o maior obstáculo que encontra o escritor
brasileiro para ingressar no universo literário? Como você divulga
o seu trabalho?
A.
S. – Os obstáculos para que o escritor ingresse na
ciranda-cirandinha são os mesmos que os arquitetos encontram para
ingressar nas rodinhas da arquitetura, os dentistas nas da
odontologia, os músicos na música, e assim por diante. Nada é
exclusivo do “universo literário”. As cercas estão por todos os
lados, cada qual querendo demarcar o lote, medindo o espaço palmo a
palmo. Não creio que há muito a acrescentar quanto a este ponto.
Compreendo esta dinâmica segundo o seu aspecto lúdico, como o
Huizinga descreve em Homo Ludens. Em geral não perco meu sono
com a questão da divulgação. Mas quando estou disputando prêmios,
acho divertido o assédio generalizado e isso estimula um competidor
que carrego internamente, mas que quase nunca se manifesta. Além
disso, acho extremamente engraçada a correria desenfreada, a
simulação de prestígio empreendida pelos próprios escritores em
torno de suas obras e de si próprios. É o que chamo de “síndrome
da autofelação”. Acompanhar de vez em quando o que é publicado
nas redes sociais é diversão garantida!
A.C.I.M.A.
– Que conselho daria à quem esta dando os primeiros passos no
universo literário?
A.
S. – Leia muito. Principalmente a Grande Literatura, os
clássicos. Se sentir que há algo a ser acrescentado, provavelmente
é uma falsa impressão. Então espere a vontade passar, resista,
adie o máximo possível. Se o ímpeto diminuir, por favor, desista.
E, principalmente, não publique nada antes dos 30 anos. Você não é
a Françoise Sagan e jamais será o Castro Alves.
A.C.I.M.A.
– Qual sua opinião sobre o momento “economicamente feliz” que
o Brasil está vivenciando atualmente? Segundo seu ponto de vista
será duradouro?
A.
S. – Sei
da existência de algumas famílias brasileiras que são
economicamente felizes e, ao que parece, esta felicidade tem durado
alguns séculos. Se os ventos continuarem soprando como sempre
sopraram, sim, essa felicidade tem tudo para durar ainda mais.
A.C.I.M.A.
– Qual é o seu objetivo literário no momento? Quais livros você
publicou? Pode nos deixar aqui uma bibliografia (título/Ano de
publicação/ Tema e público alvo/ Em uma frase a mensagem de cada
obra)?
A.
S. – Meu
objetivo literário é escrever bem. Todo o resto é irrelevante.
Este ano publicarei, pelo menos, três livros. No primeiro semestre,
serão publicados dois livros de não-ficção: “Três vinténs
para a Cultura”, um livro ensaístico com
feições de romance sobre o conceito de cultura previsto na
Constituição Federal e o panorama do incentivo à cultura no
Brasil. Além deste, será publicado em coautoria com o
documentarista Leonardo Brant o livro “Videocracia”, sobre as
perspectivas das formas de autorepresentação audiovisual e o modelo
vigente. Ambos os livros tem como público-alvo pessoas interessadas
em cultura, de maneira ampla.
No
campo da ficção, tenho dois livros em franco andamento, um romance
e um livro de contos. Pretendo publicar o romance já no segundo
semestre, mas por enquanto não gostaria de falar a respeito. Por
hora, reporto-me ao meu primeiro romance, publicado em 2012, chamado
“A Condessa de Picaçurova”. Escrevi o
romance inspirado nas pulsões sociais que assolam o Brasil e o
mundo, desde 2008. Para tanto, fiz uso de alegorias da chamada
cultura popular, pois meu maior intuito era problematizar os
paradigmas do Poder, ao mesmo tempo em que levantava questões sobre
a própria forma da contemporaneidade. Alguns leitores e críticos
dizem que o romance é uma fábula ácida, outros que é um romance
de crítica social. Não sei, não cabe a mim encontrar uma categoria
para o romance.
A.C.I.M.A.
– Se desejar deixe-nos uma mensagem, frase, reflexão ou poesia de
sua autoria, por favor!
A.
S. – Sim, aproveitando o início do 2014, desejo a todos um
excelente e profícuo ano, repleto de encontros e trocas.
Rapidinhas:
A.C.I.M.A.
– Uma saudade?
A.
S. – Minha ingenuidade.
A.C.I.M.A.
– Um sonho?
A.
S. – O Berliner Pfannkuchen com recheio de licor.
A.C.I.M.A.
– Um lugar?
A.
S. – O acolá é sempre mais interessante.
A.C.I.M.A.
– Uma música?
A.
S. – Neptune, Gustav Holst.
A.C.I.M.A.
– Uma tristeza?
A.
S. – Todas e nenhuma.
A.C.I.M.A.
– Um barulho?
A.
S. – Feira de rua.
A.C.I.M.A.
– Um cheiro?
A.
S. – Mato molhado.
A.C.I.M.A.
– Doce ou salgado?
A.
S. – Doce.
A.C.I.M.A.
– Destino ou casualidade?
A.
S. – O Acaso.
A.C.I.M.A.
– Quente ou frio?
A.
S. – Frio.
A.C.I.M.A.
– Seu hobby?
A.
S. – Nenhum.
A.C.I.M.A.
– Comida preferida?
A.
S. – A
que sacia.
A.C.I.M.A.
– O que ama?
A.
S. – Algumas pessoas.
A.C.I.M.A.
– O que não ama?
A.
S. – Muitas pessoas.
A.C.I.M.A.
– Um livro?
A.
S. – Não
vou responder.
A.C.I.M.A.
– Um filme?
A.
S. – Qualquer um do Luchino Visconti.
A.C.I.M.A.
– Uma
homenagem?
A.
S. – Melhor não.
A.C.I.M.A.
– Momento inesquecível?
A.
S. – Primeiro dia de aula.
A.C.I.M.A.
– Três coisas fundamentais para ser feliz?
A.
S. – Evitar qualquer tipo de reflexão.
Não
ter qualquer senso do ridículo.
Aceitar
as coisas exatamente como elas são.
A.C.I.MA. – Muito obrigada ANTONIO SALVADOR. Parabéns pelo seu lindo trabalho. Sucesso SEMPRE!
A.C.I.MA. – Muito obrigada ANTONIO SALVADOR. Parabéns pelo seu lindo trabalho. Sucesso SEMPRE!
Compartilhando
entrevista/resenha da Folha de São Paulo sobre “A
Condessa de Picaçurova” assinada por Alcir
Pécora:
A.C.I.MA. -
Conectando Mentes & Culturas!
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Para ter acesso as entrevistas e conhecer melhor essa geração fantástica de
artistas e escritores que, com Cores & Letras, estão escrevendo a nossa
história, clique nos links abaixo. Boa leitura.
EXTERIOR
BRASIL
A.C.I.MA. Entrevista a escritora FLÁVIA ASSAIFE.
A.C.I.MA. Entrevista o Escritor VALDECK ALMEIDA DE JESUS
A.C.I.MA. Entrevista o Professor e Escritor FRANCISCO EVANDRO DE OLIVEIRA
(Farick).
A.C.I.MA. Entrevista a Escritora HEBE C. BOA-VIAGEM A.
COSTA http://acimamandala.blogspot.it/2013/12/acima-entrevista-hebe-c-boa-viagem-costa.html
A.C.I.MA. Entrevista a Escritora GRECIANNY CARVALHO
CORDEIRO
A.C.I.MA. Entrevista a Escritora ANA CRISTINA COSTA
SIQUEIRA
A.C.I.MA. Entrevista a Escritora DULCE AURIEMO
A.C.I.MA. Entrevista a Escritora JÔ MENDONÇA ALCOFORADO
A.C.I.MA. Entrevista a Escritora VERA SALBEGO
A.C.I.MA. Entrevista a Escritora IZABELLA PAVESI
A.C.I.MA. Entrevista a Escritora SANDRA NASCIMENTO http://acimamandala.blogspot.it/2014/02/acima-entrevista-escritora-sandra.html
A.C.I.MA. Entrevista a Escritora ROGÉRIO ARAÚJO (ROFA) http://acimamandala.blogspot.it/2014/02/acima-entrevista-o-escritor-rogerio.html
A.C.I.MA. Entrevista a Escritora CRISTINA RAMOS
A.C.I.MA. Entrevista a Escritora TEREZINHA GUIMARÃES
|
E continua...
Se você é
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Brasileiro no Exterior”, escreva para:
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