A “A.C.I.M.A.”
– Associação Cultural Internacional Mandala, sediada na Itália,
desde 2011 está realizando o mapeamento dos artistas brasileiros
residentes no exterior. Este projeto “Vitrine do Artista
Brasileiro no Exterior” abraça a arte e a cultura dos povos
migrantes em todas as suas formas e manifestações
– sejam
elas,
musicais, literárias,
teatrais, artes plásticas,
cinema, dança, fotografia, folclore, enfim, todas
as
expressões
artísticas brasileiras.
A.C.I.M.A. – Bem vinda Rosemary
Mantovani, primeiramente, gostaríamos de saber um pouco sobre você:
de onde vem, qual sua terra natal? Onde vive atualmente e o motivo
que te impulsionou a viver fora do Brasil?
Rosemary Mantovani – Nasci
em Muqui no Espírito Santo, ES, e logo meus pais se transferiram
para a "capital secreta do mundo", Cachoeiro de Itapemirim,
também no ES. Depois, passei no vestibular da Universidade Federal
do Estado do Espírito Santo (UFES) e assim me mudei para Vitória,
capital do Estado, para estudar. Sou Bacharel em Economia, mas
trabalhei muitos anos como Analista de Sistemas; depois tornei-me
empresária, vendia computadores, desenvolvia sistemas (programas de
computadores) para empresas e dava treinamentos na área de
informática. Já um pouco cansada de computadores, resolvi me
dedicar ao Jornalismo e, quando fiquei mais inteligente um pouquinho,
comecei a trabalhar com fotografia/textos e criei uma revista ligada
ao mundo dos cavalos, chamada “HORSEMANIA”. Finalmente tinha
vencido minhas barreiras e iniciado a trabalhar com o que me dava
prazer e não dinheiro. Sempre tive facilidade em ciências exatas,
mas a minha grande paixão era e é o lúdico, a arte, a escrita... o
imaginário fazendo-se real.
Misturando as respostas das duas
últimas perguntas, sempre tive vontade de me mudar para Itália, mas
em 1988, quando estava me organizando para isso, engravidei de meu
terceiro filho, o que não estava em meus planos, como também não
estava em meus planos que ele fosse um filho com necessidades
especiais. Geralmente, essas coisas acontecem com um filho de um
amigo do amigo, nunca com a gente. Bem, os problemas com meu filho se
iniciaram quando ele tinha 11 meses de idade, depois que ele teve uma
gastroenterite. Devagar, bem devagar, fui entendendo a extensão do
problema e finalmente, quando ele completou 7 anos de idade, tive a
diagnose: meu filho era AUTISTA
(http://www.rosemarymantovani.com/autismo_14.html).
Bem, não vou entrar em mais detalhes, pois a história é longa e
nem dá para dizer que foi a partir daquele momento que minha vida
mudou, porque a minha vida já tinha mudado desde que percebi que
Saulo, o meu filho especial, era diferente dos irmãos dele. Lutei
desesperadamente no Brasil para uma vida melhor para esse filho, uma
escola onde ele pudesse frequentar e aprender alguma coisa para
melhorar sua qualidade de vida. Infelizmente, o Brasil não me deu
nada nesse sentido. Vivi cada segundo de minha vida para esse filho,
dando murros em ponta de faca, até que um dia decidi vir para a
Itália. Justamente por esse filho que um dia não me permitiu vir
(ironias da vida?). Meu marido, na época, duvidou que eu deixasse o
Brasil sozinha com o Saulo para, segundo ele “me aventurar”.
Resumindo, deixei meus pais já idosos, marido e uma filha no Brasil.
Meu filho mais velho já morava em Londres, veio à Itália e alugou
uma casa para mim, dando-me um empurrão inicial. Saulo completou 18
anos aqui na Itália. Morei na grande Milão onde ele frequentou um
centro diurno, mas sou muito exigente e não estava satisfeita,
chutei o pau da barraca de novo e estou há quase um ano na Toscana,
onde meu filho frequenta um centro diurno especializado em autismo.
Estou muito satisfeita. Saulo está muito bem e me parece feliz.
Trocando em miúdos, a minha decisão de viver fora do Brasil foi a
possibilidade de uma vida melhor para meu filho e, por tabela,
ainda vivo em um país que valoriza a arte de um modo geral.
A.C.I.M.A. – Como foi sua
adaptação na Itália? Quais as maiores dificuldades que encontrou?
As maiores alegrias? Contou com o apoio de alguma organização que
apoia os imigrantes brasileiros?
Rosemary Mantovani – Eu sou
ítalo brasileira, o que não significa realmente nada perante os
italianos, mas com meu jeitinho brasileiro acabei conquistando muita
gente. A minha adaptação na Itália deu-se de uma maneira muito
natural, na verdade, sempre amei a Itália e curti desde pequenininha
as histórias de meus pais e avós sobre este país. Então, era como
se uma parte de mim tivesse sempre vivido aqui, não sei lhe
explicar...
As maiores dificuldades que
encontrei estão relacionadas ao emocional. Em Milão, por exemplo,
onde vivi por mais de cinco anos, as pessoas são muito frias, não
são habituadas a ir à casa da gente, a telefonar etc. Mas eu
realmente não posso reclamar tanto, pois ainda assim acabei fazendo
muitas amizades com pessoas que se preocupavam comigo e com meu
filho, pois sabiam que vivíamos sozinhos aqui. Em poucos meses, já
conhecia muitas pessoas. Agora, moro há pouco tempo na Toscana (moro
em Pistoia, perto de Florença) e as pessoas são bem mais abertas.
Ainda não conheço todos, porque a cidade é bem grande, mas
acredito que dentro de mais uns meses já conhecerei mais da metade
da cidade, ahahahahahahah...
Profissionalmente falando, minhas
maiores alegrias foram: publicar, na Itália, meu livro “MEMORIE DI
UN PENSATORE IRRAZIONALE” e, no ano passado, ganhar um prêmio
nacional de cinema com meu documentário “E-MAIL PER LAURA”. Este
último me enche de orgulho, pois ganhar um prêmio desse valor na
Itália, que é famosa pela qualidade de seus filmes, me faz sorrir
sozinha até hoje de tanto prazer e emoção. Na verdade, ganhei dois
prêmios: o dos jurados e do público presente e, só para se ter uma
ideia, um dos jurados que escolheu meu documentário, Bruno Fornara,
faz parte do júri do festival de Veneza. Nesse concurso, estavam
concorrendo também vários profissionais do cinema italiano. Acho
que tenho motivos para estar orgulhosa. Mais recentemente me
tornei membro da Academia Cachoeirense de Letras e um dia depois
também da Academia de Letras do Brasil - Seccional/Suíça, o que
mostra o reconhecimento do meu trabalho também no país onde nasci.
Eu não contei com nenhuma
organização que apoia imigrantes brasileiros, nem sei se existe
aqui na Itália. E sinceramente, nem pensei em procurar.
A.C.I.M.A. – Como e quando
se dá o seu primeiro contato com a escrita? Sobre qual tema você
escreve? De onde vem as inspirações para suas obras literárias?
Rosemary Mantovani – Eu
fazia poemas e escrevia músicas desde que fui alfabetizada e escrevi
meu primeiro livro entre os 12 e 13 anos de idade. Mas, falando de
publicações em livros, minha primeira experiência se deu em
outubro de 2001, quando fui convidada a participar de um livro sobre
cavalos, escrevendo toda a parte de equoterapia, tanto técnica
quanto emocional.
Eu escrevo sobre tudo em que
acredito, não tenho um tema específico, apesar de a maioria dos
temas sobre os quais escrevo versarem sobre a vida e seu cotidiano,
acho que é porque amo a vida.
Minhas inspirações vêm
naturalmente, me sento e começo a escrever. Em um dado momento, os
personagens tomam conta da situação e conduzem o romance, meu
trabalho, então, consiste em conter meus personagens, pois a maioria
deles não têm medo de amar ou de sofrer, são fortes e
despudorados; preciso freá-los sempre.
A.C.I.M.A. – Qual foi a pessoa
que primeiramente acreditou em seu talento? E qual outra linguagem da
Arte tem o seu interesse?
Rosemary Mantovani – A
primeira pessoa a acreditar em mim foi eu mesma, pois jamais parei de
escrever mesmo estudando e trabalhando em outras áreas. Menos de um
ano antes de vir para a Itália, terminei de escrever “MEMORIE DI
UN PENSATORE IRRAZIONALE” e dei para meu irmão Rosalvo Mantovani
ler. Meu irmão é professor da Língua Portuguesa em uma
Universidade de Vitória ES (Brasil) e ele simplesmente adorou e
disse que eu deveria publicar o livro. Naquela época, porém, minha
cabeça já estava na Itália e assim, dois anos depois, publiquei
aqui, naturalmente, em italiano.
Outra linguagem da arte que me
interessa? Na verdade são duas: fotografia e cinema. As fotos falam
por si e o cinema coloca movimento em minhas falas.
A.C.I.M.A. – Como você divulga
o seu trabalho? O que você acha que seria prioritário fazer para
divulgar o trabalho dos artistas brasileiros que vivem no exterior?
Rosemary Mantovani – Eu
acredito que quando você emana uma energia para o universo essa
energia volta para você, no mínimo, com a mesma intensidade e, a
partir do momento em que acreditamos em nós mesmos, o universo
conspira a nosso favor. Vou contar uma história: apresentei meu
livro “MEMORIE DI UN PENSATORE IRRAZIONALE” para minha Comune
(Prefeitura) e sugeri fazermos uma apresentação com uma noite de
autógrafo, o que eles não aceitaram. Na tarde desse mesmo dia, uma
pessoa, que não me conhecia, me telefonou (ela pegou meu contato na
livraria) e me fez uma proposta: ela havia comprado meu livro na
livraria de uma cidade vizinha, leu e gostou muito da história. Como
responsável pela biblioteca de uma cidade bem maior que a minha, me
propôs fazer uma apresentação do livro e uma noite de autógrafos.
Bem, acho que o sindaco (prefeito) da minha cidade se arrependeu
horrores de não ter tido essa iniciativa, porque a noite de
autógrafos foi um sucesso, com mais de 100 pessoas presentes (quem
já fez ou foi em noite de autógrafos sabe que 100 pessoas nesse
caso é muita gente), além da repercussão em vários jornais antes
e depois do evento, inclusive em jornais nacionais (Itália). E aí
uma coisa foi puxando outra e...a publicidade aconteceu. Como não
acredito em coincidências e nem no destino, tenho certeza de que as
forças e energias atuaram no universo a meu favor. Acredito que nós
recebemos aquilo que oferecemos.
Bem, divulgo meu trabalho,
registrando todas essas coisas, faço vídeos e publico. No YouTube,
por exemplo, ao se pesquisar “rosemary mantovani”,
encontra-se meu canal onde há vários vídeos, inclusive meu
documentário premiado na Itália e a noite de premiação desse
mesmo filme. Ao pesquisar meu nome no Google, encontram-se várias
informações que outras prefeituras (como de Veneza e Torino)
publicaram. Nem eu mesma sei direito tudo o que há, sempre acho
novidades a meu respeito.
Para divulgar o trabalho dos
artistas brasileiros no exterior, penso que, a princípio, o melhor
seria estabelecer contatos com associações culturais como a
A.C.I.M.A., por exemplo. Ou outras entidades sérias e que estão
preocupadas em divulgar nossos trabalhos.
A.C.I.M.A. – Quais seus
propósitos e novidades literárias para 2012?
Rosemary Mantovani – Até o
final do ano, se Deus quiser, pretendo lançar um livro de fotos e
poesias, depois divulgo a data e local de lançamento. Aguardem...
A.C.I.M.A. – Que conselho daria
a quem está dando os primeiros passos no universo literário no
exterior?
Rosemary Mantovani – Olha,
conselho é uma coisa difícil de se dar, mesmo porque o que funciona
para um, pode não funcionar para outro. A única coisa que posso
dizer é: sonhe, mas sonhe muito, acredite que esse sonho pode se
tornar realidade e trabalhe, mas trabalhe bastante para esse(s)
sonho(s) se realizar(em). O segredo é um só: acredite em você
acima de todas as coisas.
A.C.I.M.A. – Você pretende
(sonha) voltar a viver no Brasil? Qual sua opinião sobre o momento
“economicamente feliz” que o Brasil está vivenciando atualmente?
Segundo seu ponto de vista será duradouro?
Rosemary Mantovani – Não,
não pretendo voltar a viver no Brasil por dois motivos: o primeiro
deles é que lá não existe uma realidade para meu filho e se não
existe para ele também não existe para mim; o segundo é que quando
vivemos em uma cultura diferente, descobrimos novos horizontes e é
difícil se adaptar de novo ao Brasil. Isso sem citar a violência,
que me assusta muito.
Quanto ao momento “economicamente
feliz” do Brasil, não vejo exatamente assim, mas sou suspeita em
dizer, porque odeio política. O Brasil sempre será um país do
futuro, um futuro que não chegará jamais e isso me entristece
muito. Eu não sou uma pessoa pessimista, muito pelo contrário, o
problema é que sou uma sonhadora realista, pois sonho com os pés no
chão. Quando vejo que os políticos brasileiros não fazem nada para
mudar concretamente a vida dos portadores de necessidades especiais,
que não se preocupam com a qualidade de vida deles e de suas
famílias, percebo o quanto as pessoas que dirigem o Brasil são
atrasadas, o quanto fazem mal à sociedade. A negligência nesses
casos, e em tantos outros, me dá nojo. Para mim, a maioria dos
políticos são corruptos que tiveram a grande chance de mudar o
Brasil e nada fizeram e agora já é um pouco tarde para se fazer
algo. Como não gosto, não vejo e não acompanho política, espero,
de coração, estar enganada.
A.C.I.M.A. – Qual é o seu
objetivo no momento? Se desejar, deixe-nos uma mensagem por favor!
Rosemary Mantovani – Meu
maior objetivo hoje, e sempre, será viver intensamente cada segundo,
descobrir o mundo como se tivesse chegado aqui agora. Continuar
escrevendo muito e lutar para melhorar a qualidade de vida dos
portadores de necessidades especiais. Como disse, não gosto de
política e muito menos sou política e isso me deixa mais à vontade
para denunciar os descasos e mostrar a todos os problemas que nós,
como família, e os portadores de necessidades especiais enfrentamos.
Aguarde, Brasil, meu grito está chegando aí e muita gente sentirá
a necessidade de tapar os ouvidos e os honestos gritarão comigo.
Vou deixar três mensagens e um
porquê: acredite em você, acredite em você e acredite em você,
porque se você não o fizer ninguém o fará.
Obrigada a A.C.I.M.A. e a todos
vocês. Obrigada!
Rapidinhas:
ACIMA - Uma saudade?
RM
- Minha família no Brasil.
ACIMA - Um sonho?
RM
- Conhecer o resto do mundo.
ACIMA - Um lugar?
RM
-Difícil…Paris, Londres.
ACIMA - Uma música?
RM
- Como uma onda no mar (Lulu Santos).
ACIMA - Uma tristeza?
RM
-O descaso do Brasil com os portadores de necessidades especiais.
ACIMA - Um barulho?
RM
- Do mar.
ACIMA - Um cheiro?
RM
- De amor.
ACIMA
- Doce ou salgado?
RM
- Salgado.
ACIMA - Destino ou
casualidade?
RM
- Nenhum dos dois, nós fazemos acontecer... ou não.
ACIMA - Quente ou frio?
RM
- Quente.
ACIMA - Seu hobby?
RM
-Fotografia.
ACIMA - Três coisas
fundamentais para ser feliz?
RM
- Família, coragem e amor.
ACIMA - Comida preferida?
RM
- Churrasco.
ACIMA - O que ama?
RM
- A vida.
ACIMA - O que não ama?
RM
- A tristeza.
ACIMA - Um livro?
RM
- Cem anos de solidão.
ACIMA - Um filme?
RM
-Todos que me façam pensar.
ACIMA - Uma mensagem?
RM
- Nunca, jamais, em hipótese alguma se importe com o que dizem
ou pensem de você.
ACIMA - Uma frase de sua
autoria?
RM
-
Cheiro de chuva
Sinto o cheiro de chuva
que molha a terra seca.
Uma brisa passa e me toca
fazendo-me abrir os braços e
respirar fundo.
De repente, num impulso de menina,
abro a porta
e saio correndo para parar debaixo
da chuva;
sentir as gotas molharem minha
roupa, meu corpo, meu cabelo...
Há muito tempo não sentia
essa sensação, essa liberdade.
Sensação inocente de menina
travessa.
Cheiro de chuva...
Sempre traz recordações preciosas.
Não sei quanto tempo a chuva durou,
não sei quanto tempo fiquei ali
sentindo a chuva no meu rosto
e sorrindo com as lembranças.
Escutei minha mãe chamando: saia da
chuva menina!
Foi nesse momento que entrei
correndo ainda mais do que quando
saí,
esperava ver a minha mãe,
mas ela não estava ali.
Eu só queria abraçá-la
e sei que dessa vez
ela nem se importaria por eu estar
molhada.
Mas ela não estava ali...o cheiro
da chuva tinha acabado.
30/06/2012 – rosemary mantovani
ACIMA – Seu lema?
RM
- Amar...sempre.
ACIMA – Um agradecimento?
RM
- Aos meus pais (Luzia e Rafael) por terem me preparado para a
vida, mesmo que eu não tenha aprendido nada.
ACIMA – Parabéns pelo seu
trabalho Rosemary Mantovani, sobretudo, parabéns pela dignidade e
coragem com que enfrente seu percurso humano...
E para conhecer melhor o trabalho de Rosemary
Mantovani clique nos links abaixo.
Contato pessoal:
rosemarymantovani@hotmail.it
YouTube – pesquise: rosemary
mantovani, tem vários vídeos
Facebook: tem muitas fotos
Se quiser saber ainda mais, pesquise
no Google: rosemary mantovani
Se desejar falar conosco:
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